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Vitória histórica do povo caiçara de Trindade

Mais uma batalha vencida...

Foi com muita alegria e alivio que o Fórum de Comunidades Tradicionais - FCT recebeu a notícia da decisão judicial proferida em 17/12/2022 pela 1 Vara Federal de Angra dos Reis o , que REVOGOU o mandado de demolição de ranchos caiçaras na Praia do Meio da Trindade, pertencentes à família caiçara de Dona Dolores.



Sobre a ação judicial...

A família de dona Dolores, pertencente à comunidade tradicional caiçara da Trindade, enfrenta uma Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal e ICMBIO, em face da Sra. Dolores Lopes de Oliveira Justo, sob alegação de crime ambiental no interior do Parque Nacional da Serra da Bocaina - PNSB. Dona Dolores faleceu antes do final do processo, mas seu filho Milton de Oliveira Justo permaneceu nessa luta histórica pela família.


Mesmo sendo uma comunidade tradicional caiçara ancestral, que vive no local muito antes da instalação do PNSB e que possui especial proteção legal nacional e internacionalmente, o Juízo, inicialmente, deferiu liminar para autorizar a demolição das construções de Dona Dolores na Praia do Meio.


O Fórum de Comunidades Tradicionais, através de sua assessoria jurídica, participou da defesa da família de Dona Dolores como amicus curiae no processo. O termo amicus curiae é uma expressão latina utilizada para designar o terceiro que ingressa no processo com a função de fornecer subsídios ao órgão julgador.




O impacto da relação dos povos tradicionais com as Unidades de Conservação, criadas posteriormente à existência das comunidades tradicionais nos territórios, ameaçando por vezes seus modos de vida, sem procurar a possível coexistência, como no caso em questão, sempre foi uma preocupação do FCT. Entretanto, há mudanças importantes relativas aos conflitos socioambientais derivados da sobreposição de unidades de conservação a territórios de povos e comunidades tradicionais.


O Ministério Público Federal, especialmente por meio da 6ª Câmara de Conciliação e Revisão, ao emitir Manual de Atuação e enunciados específicos a respeito do conflito, tem se posicionado de forma decidida no sentido de considerar direitos territoriais de povos indígenas e demais comunidades tradicionais tão dignos de proteção quanto a manutenção da biodiversidade, ressaltando a importância da coexistência entre povos tradicionais e meio-ambiente. O Conselho Nacional do Ministério Público, por meio da Resolução nº 230, de 08 de junho de 2021, padronizou e regulamentou a atuação da instituição junto aos povos e comunidades tradicionais, incorporando a gramática da interculturalidade, o direito à autonomia e o respeito pleno à Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho. Com relação aos territórios, o documento reconhece expressamente que remoções e deslocamentos forçados implicam violações de direitos humanos.


Há pouco tempo, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), após décadas de conflitos com povos indígenas e comunidades tradicionais, consagrou linha de atuação que objetiva compatibilizar interesses ambientais e de comunidades presentes em unidades de conservação.


O Parecer 00175/2021/CPAR/PFE-ICMBIO/AGU, de outubro de 2021, promove uma releitura do artigo 42 do Sistema Nacional de Unidades de Conservação à luz da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, passando a sustentar, de forma definitiva e vinculante com relação ao órgão, a legitimidade da dupla afetação e gestão compartilhada de territórios tradicionais afetados por unidades de conservação de proteção integral. Recentemente, a gestão do PNSB deu início à elaboração de Termos de Compromisso, que serão firmados com famílias tradicionais caiçaras pertencentes à comunidade da Trindade, cumprindo suas obrigações determinadas pelo SNUC, notadamente aquelas no sentido de assegurar a permanência de populações tradicionais em seus territórios ancestrais.


Reconhecida como família tradicional pelo PNSB, espera-se como desfecho para esse injusto episódio, que a elaboração de um Termo de Compromisso, conforme determinação legal, também seja oportunizada à família de dona Dolores. Sobre o território tradicional caiçara da Trindade e a importância de Dona Dolores e sua família pra comunidade...

A Comunidade Caiçara da Trindade tem sua história marcada por um dos mais graves conflitos territoriais da região. Desde a década de 70, a comunidade é vítima da especulação imobiliária, bem como da omissão do Estado e, apesar de ter sua tradicionalidade reconhecida pelo PNSB, durante muitos anos foi oprimida por uma perversa e arbitrária política de gestão ambiental de unidades de conservação de proteção integral, a despeito de toda legislação – nacional e internacional -, que protege as populações tradicionais.


Dona Dolores não passou despercebida pela história de luta da Trindade, muito ao contrário. Foi uma importante liderança caiçara, lembrada até os dias atuais por sua trajetória em defesa da comunidade e da natureza. Foi Dona Dolores que se colocou deitada à frente de um trator para impedir que a máquina mudasse o curso do rio na Trindade. Tal fato marcou para sempre a importância desta mulher de luta para a comunidade tradicional caiçara da Trindade.


...vida longa aos que lutam...


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