Moradores da Praia do Sono sofrem agressões e são impedidos de passar pelo Condomínio Laranjeiras
Em luta pelo direito de ir e vir, comunidade caiçara passa mais uma vez por cenas de agressão e repressão de direitos.
Moradores da comunidade caiçara do Sono, em Paraty (RJ), continuam sofrendo restrições e foram impedidos de atravessar a passagem pelo Condomínio Laranjeiras, localizado na entrada de barcos que dá acesso à praia. Desde que foi construído, na década de 1970, o condomínio de luxo provoca constrangimentos e problemas para os moradores dessa comunidade, cujo acesso ao seu território tradicional se dá por um porto localizado na marina do condomínio. As ações do empreendimento ferem o direito de ir e vir, garantido pela Constituição Federal de 1988 (Artigo 5, inc. XV).
Nos últimos dez anos, os caiçaras buscaram firmar acordos de convivência com o Condomínio, sempre respeitando-os. Os acordos mantinham na sua essência uma relação desigual e restritiva às comunidades, tendo como pano de fundo “viabilizar a passagem dos moradores tradicionais, sem “incomodar” os condôminos com sua presença”.
Chegou ao ponto de os moradores serem impedidos de transitar a pé pelo Condomínio, que desde então só podem acessar o cais de embarque em uma kombi do Condomínio, com horários estipulados. A passagem de compras, pescado e gelo tem horário determinado e só pode ser feita de 2ª a 6ª feira. Volumes maiores de compras e materiais de construção passaram a ser transportados por um barco de pequeno porte alugado pelo Condomínio, fazendo o trajeto por mar aberto de Paraty até o Sono, percurso que leva no mínimo quatro horas e, na maioria das vezes, é impossibilitado pelas condições do mar. Até a prestação de serviço público essencial de retirada de lixo dessas comunidades foi impedida de passar pelo cais do Condomínio, passando a ser feito por este mesmo barco alugado de forma ineficiente.
Em julho de 2009, a situação se agravou e a Associação de Moradores Originários da Praia do Sono entrou com uma Representação contra o Condomínio Laranjeiras no Ministério Público Federal, gerando uma Ação Civil Pública, que segue em curso.
No dia 2 de setembro de 2016, uma moradora foi agredida por um segurança do condomínio quando tentou fazer a travessia caminhando. Recentemente, negaram também ajuda a uma jovem moradora do Sono que estava em trabalho de parto com necessidades urgentes de ser transportada. Essas atitudes descumprem um acordo feito entre lideranças da comunidade e o condomínio, que havia garantido um veículo para fazer travessia dos moradores sempre que necessário. A repressão aconteceu de maneira árdua e os portões foram fechados impedindo a comunidade de passar.
“As pessoas que chegam até o local não conseguem pegar a condução e perdem compromissos, horários de ônibus, entre outros entraves que impossibilitam a chegada delas até o acesso de saída”, destaca Marcela Cananéa, do Fórum de Comunidades Tradicionais (Angra, Paraty e Ubatuba) e colaboradora do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS). Segundo ela, a falta de dois motoristas para revezar o translado dos passageiros faz com que esses problemas dificultem a passagem das pessoas e faça com que tenham que atravessar a pé.
"Estamos em meio a processos jurídicos, junto ao Ministério Público Federal, e com uma ação discriminatória no Supremo Tribunal Federal. Estamos em guerra, lutando pelo direito de morar em uma comunidade que sempre foi nossa", afirma Jardson Santos, liderança comunitária do Sono. Alguns moradores também estão sofrendo processos e correm o risco de serem presos por se manifestarem contrários a algumas regras impostas pelo condomínio. Todos esses vetos contradizem os direitos assegurados pelo Tratado Internacional da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) - Decreto 6.040/2007.
Fotos: Moradores do Sono